04 Julho 2023
"A ausência do presidente nas conversas naturalmente lança uma luz negativa sobre a missão de Zuppi em Moscou. Porém, somente depois de algum tempo, constatando se haverá ou não as iniciativas humanitárias desejadas pelo Vaticano, será possível fazer uma avaliação mais ponderada", escreve Luigi Sandri, jornalista italiano, em artigo publicado por L'Adige, 03-06-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Grande empenho para tentar resolver problemas internacionais complexos, como a permanente conflito russo-ucraniano e, juntos, medidas curiais repressivas do livre debate na Igreja Romana, três meses antes de um Sínodo que deveria enfrentar com audácia também questões de ética sexual.
O Cardeal Matteo Zuppi, arcebispo de Bolonha e presidente da Conferência Episcopal Italiana, nos últimos três dias de junho esteve em Moscou, como enviado do Papa Francisco, não para um trabalho de mediação política entre Rússia e Ucrânia para pôr fim ao conflito (iniciado em 24 de fevereiro de 2022 com a “Operação militar especial” decidida pelo Presidente Vladimir Putin) mas, sim, por uma iniciativa humanitária, como o regresso ao país de milhares de crianças ucranianas deportadas – acusa Kiev – para a Rússia.
No entanto, se na análoga "missão" na Ucrânia, no início de junho, o cardeal pôde também se encontrar com o presidente Volodymyr Zelensky, em Moscou, Zuppi não pôde ver o chefe do Kremlin, e nem mesmo o chanceler Seghiei Lavrov, mas apenas Yuri Ushakov, assistente do presidente russo para assuntos de política externa, e Maria Lvova-Belova, Comissária de Putin para os Direitos da Criança.
A ausência do presidente nas conversas naturalmente lança uma luz negativa sobre a missão de Zuppi em Moscou. Porém, somente depois de algum tempo, constatando se haverá ou não as iniciativas humanitárias desejadas pelo Vaticano, será possível fazer uma avaliação mais ponderada.
No entanto, o cardeal foi recebido pelo patriarca Kirill. Ambos sublinharam a importância de suas respectivas Igrejas trabalharem pela paz; mas ficou uma divergência radical na avaliação das causas e responsabilidades da guerra em curso. O chefe da Igreja Russa reiterou suas posições, que seguem as de Putin: a "operação militar especial" é mais do que justificada. Tese rejeitada por Francisco.
Diante desses grandes empenhos, pensados pela Santa Sé para promover a paz no mundo, nos deixou atônitos uma minúscula história, mas potencialmente explosiva, divulgada na Itália no final de junho. O dicastério vaticano para a cultura e a educação, liderado pelo cardeal português José Tolentino de Mendonça, negou o "Nihil obstat" para a eleição, decidida pelo corpo docente, do pe. Martin Lintner, professor de Teologia moral, como reitor do Studio teológico acadêmico de Bressanone. Por quê? "Por causa de suas publicações sobre questões de moral sexual católica".
Ora Lintner – sobre contracepção, divorciados recasados, coabitação, casais LGBT+ – confirma teses "liberais" bastante difundidas no mundo teológico. Ou a censura da Cúria Romana talvez seja uma forma de dizer que esses problemas não poderão ser discutidos livremente no Sínodo de outubro? Então uma pergunta se impõe: terá futuro uma Igreja se não relacionar suas doutrinas com o Evangelho, para confirmá-las, se o interpretam, mas recusá-las, se o desfiguram?
Leia mais
- Não vamos parar de buscar a paz ou será a “Terceira Guerra Mundial”. Artigo de Matteo Zuppi
- Kirill não falou com Zuppi sobre um encontro com o Papa
- Kirill agora é um “pacifista”, mas antes falou em uma “guerra justa”, e assim explicou o ataque à Ucrânia: “É certo lutar, é uma guerra contra o lobby gay”
- Ria Novosti: Kirill e Zuppi concordam em dizer que as Igrejas devem servir a paz
- O cardeal Zuppi encontra apenas um funcionário de nível médio no Kremlin e trabalha para repatriar 20.000 crianças ucranianas
- Zuppi em Moscou: D. Pezzi (bispo russo), “ótimas notícias. Após os últimos acontecimentos, a urgência e a disponibilidade para a paz parecem ter aumentado”
- Parolin: “espero pela paz na Ucrânia, mas no momento não vejo perspectivas”
- A agência russa Ria Novosti ataca a missão de paz do Papa? A missão de Zuppi é como aquela em Moçambique
- Dias após tentativa de golpe de Estado, Papa Francisco envia cardeal para negociações de paz
- Parolin: “espero pela paz na Ucrânia, mas no momento não vejo perspectivas”
- As convergências entre o Papa e Putin
- Rússia, o silêncio do Papa e a iniciativa de Kirill
- Patriarca de Moscou Kirill pede apoio ao presidente Putin
- Kirill: “Digo não a uma escalada do conflito”
- A traição de Prigozhin é inaceitável, independentemente da opinião de alguém sobre a operação especial. Artigo de Andrew Korybko
- Zuppi em Kiev na hora mais difícil: "A paz não deve permanecer apenas um sonho"
- Poderá o Papa Francisco promover a paz na Ucrânia? Artigo de Thomas Reese
- Zelensky esfria as expectativas de paz do Vaticano: "A Rússia deve retirar todas as suas tropas do território da Ucrânia"
- Papa Francisco convida o Minuto pela Paz que unirá fiéis de diferentes religiões na quinta-feira, 8 de junho
- “Zuppi é a manobra certa para a paz. Eu estou recomeçando, mas não será outra Bose”. Entrevista com Enzo Bianchi
- Vaticano: enviado do Papa a Kiev reuniu-se com Volodymyr Zelensky
- O Kremlin nega que Putin planeje se encontrar com Zuppi em Moscou
- Dois dias intensos para o cardeal Zuppi em Kiev. Possíveis reuniões para traçar o “mapa do Vaticano” da Ucrânia após a agressão
- O mundo pede a paz. Como acabar com a guerra na Ucrânia
- Dois dias intensos para o cardeal Zuppi em Kiev. Possíveis reuniões para traçar o “mapa do Vaticano” da Ucrânia após a agressão
- Paz na Ucrânia: Zuppi enviado do Papa a Kyiv em 5 e 6 de junho
- A rede do Vaticano para ajudar Zuppi na Ucrânia fica mais fraca, o Papa pede ajuda ao presidente Lula
- Carta aberta sobre o caso do professor Martin Lintner
- Veto do Vaticano a reitor de teologia no norte da Itália gera críticas internacionais
- Pior do que a censura, só a autocensura: o caso do teólogo Lintner e o serviço eclesial dos teólogos. Artigo de Andrea Grillo
- O caso Lintner. Artigo de Marcelo Neri
- Cardeais da Cúria Romana travam batalha sobre moral sexual
- Sínodo sobre a sinodalidade: “Nossa Igreja precisa ser pobre com os pobres”. Entrevista especial com Silvia Kreuz e Dom Vicente de Paula Ferreira
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Guerra e moral, uma política de duas caras. Artigo de Luigi Sandri - Instituto Humanitas Unisinos - IHU